segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Fumaça do cigarro saindo pela janela da cozinha. Bolos e pães em cima da mesa, tenho preguiça de guardar e sei que amanhã terei que pegar formiga por formiga e que algumas agonizarão na minha boca. Apesar do nojo, irei engolir, pois estarei faminta. Mas escondo o sonho de doce de leite na geladeira, porque ele é só meu.  Risadas no fundo do apartamento, mais um viral sendo regurgitado. Meu estômago se embrulha e dou mais um trago. Encho o copo de água, deixo minhas roupas na lavanderia, saio andando nua e meus pés descalços e sujos deixam rastros pelo piso onde derramei gotas de água do copo cheio demais. Chego ao espelho, dúvidas dúbias, dor de cabeça e tosse. Embora minha aparência esteja uma merda, meus seios continuam inabaláveis, as manchas dos ombros aumentando com os dias. Escuto gemidos dos vizinhos de baixo, sempre por volta da meia noite, forço o máximo de silêncio para escutar e ver se sai alguma palavra. Nada, só gemidos contidos de trepa com hora marcada. Mesmo assim, a imaginação se arrisca a adivinhar a posição pelo timbre. Distraída, minha mão arranja uma ocupação. Tantos livros na cabeceira(mesmo não completamente lidos, eles se completam), controle remoto desmontado já desistiu quem o conserte, cortina blackout e eu desmaiada no travesseiro. Muriçocas me sugando pelo corpo todo, coço até sangrar enquanto tento pegar alguma no ar e apesar da lentidão por causa do bucho cheio elas conseguem se safar. Sou forçada a levantar e ligar o ventilador, bebo um golinho da água, sempre de pouquinho em pouquinho, nunca o copo todo, gosto de deixar um resquício de sede, e interromper o sonho na madrugada pra saciar. Vou na janela, afasto a cortina e tava tão bonito e escuro que não dava pra ser capturado numa fotografia, então leve e s-o-l-t-a, sentindo sem poder registrar, como uma borboleta com uma das asas machucada, com raiva do grilo(ambiciono tornar todo barulho sustentável), mato uma formiga, que lambia um ácaro, que se alimentara a pouco do esperma ressequido do lençol, e desato a dormir com os pés sujos.